Em um ano, o dólar teve uma escalada expressiva, saindo de R$ 4,85 em 1º de janeiro para o patamar histórico de R$ 6,26 em 18 de dezembro. O movimento fez com que o Banco Central começasse uma rodada de leilões bilionários, em uma tentativa de controlar a alta da moeda norte-americana.
Até agora, o real é a moeda que mais desvalorizou frente ao dólar em 2024, de acordo com dados da consultoria Elos Ayta. Até a última terça-feira (17), a moeda brasileira acumulava desvalorização de 21,52%, patamar muito próximo do registrado em 2020, ano da pandemia. Mas como funcionam esses leilões do Banco Central?
Segundo o economista do Terraço Econômico, Caio Augusto Rodrigues, trata-se de operações em que o BC utiliza suas reservas internacionais para colocar dólares no mercado, aumentando a oferta da moeda em momentos de forte desvalorização do real. Entretanto, essas operações não são livres de riscos.
“Essas operações são delicadas, porque podem incendiar a reação do próprio mercado: num momento em que todo mundo está querendo comprar dólar, pode acontecer das ofertas desses leilões irem embora rapidamente e o efeito sobre a cotação ser nulo ou até mesmo negativo”, afirma.
Na avaliação de Rodrigues, o compromisso mais sólido do Banco Central para controlar o dólar está nos juros. Isso porque ao ajustar o diferencial de juros entre o Brasil e mercados como os Estados Unidos, a autoridade monetária atrai capital estrangeiro e ajuda a conter desvalorizações futuras.
Razões para a alta do dólar
O movimento de alta do dólar reflete tanto questões internas quanto externas. Do lado doméstico, o cenário fiscal é um dos principais gatilhos. Rodrigues afirma que a elevação é algo que se desenha há mais ou menos um ano.
“O governo criou uma enorme expectativa em cima do pacote de ajuste fiscal e chegou com algo que, na melhor das hipóteses, não entrega um décimo do tamanho do problema”, afirma. Ele lembra que, apesar de avanços na arrecadação em 2023, o governo não conseguiu equilibrar o crescimento das despesas.
Além disso, decisões recentes do Federal Reserve (Fed), como o corte de 25 pontos-base nas taxas de juros e a sinalização de menos cortes em 2025, complicaram ainda mais o cenário. “O derretimento recente já era visível pelo lado doméstico, mas agora se intensifica com a pressão externa negativa”, avalia o economista.
Impactos na economia
Se por um lado a valorização do dólar é boa para as exportações, por outro o custo de insumos e outros produtos importados, como o trigo, até máquinas e equipamentos especializados, é fortemente impactado. De acordo com Rodrigues, embora o repasse ao consumidor final não seja imediato, em até dois trimestres essa alta cambial deve impactar a inflação.
O economista alerta ainda para a possibilidade de um cenário inflacionário semelhante ao período pós-pandemia, quando a inflação anual ultrapassou os dois dígitos.
Expectativas para o câmbio
As previsões para o dólar indicam volatilidade. “Com o fluxo de saída atual e a inação do governo, podemos sentir saudades do dólar a R$ 6 em pouco tempo”, afirma Rodrigues.
Caso o governo interfira na autonomia do Banco Central, a situação pode se agravar, como aconteceu na Turquia em 2019. Naquele país, após mudanças no comando do BC e decisões políticas equivocadas, a moeda local sofreu uma desvalorização drástica.
Para o Brasil, a lição é clara. “Se o país quebrar a régua dos juros após ter quebrado a régua fiscal, não podemos de jeito nenhum descartar uma desvalorização como nunca antes vista em nossa moeda frente ao dólar”, finaliza.